Postos de combustíveis: é possível revisar o contrato de bandeira?
No Brasil para ter um posto de gasolina e revenda de combustíveis o empresário precisa fazer uma escolha entre ter uma “bandeira” ou ser “bandeira branca”.
Ter bandeira na prática é ser revendedor exclusivo de uma distribuidora, atualmente as distribuidoras são Shell, Ipiranga, BR Distribuidora e algumas poucas outras.
Ser bandeira branca é poder comprar de quem quiser sem ostentar alguma das marcas que dão bandeiramento aos postos de revenda de combustíveis.
O fluxo comercial de combustíveis tem a seguinte origem:
Só a refinaria Petrobrás vende Gasolina e Diesel, com raras exceções via importação.
O Etanol é vendido pelas Usinas.
As Distribuidoras compram Gasolina e Diesel da Petrobrás e Etanol das Usinas e revendem para os postos de combustíveis que por sua vez vendem os produtos ao consumidor final.
E tudo isso é regulamentado e fiscalizado pela ANP – Agencia Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
Os empresários de revenda ao consumidor firmam com as distribuidoras contratos de “CESSÃO DE MARCAS E FORNECIMENTO DE PRODUTOS”, e são levados a pensar que isso é um tipo de parceria, as distribuidoras acenam com a idéia de que darão suporte ao revendedor, que haverá colaboração, que irão ajudar em momentos difíceis e vários outros argumentos do tipo.
Mas na prática outra realidade é apresentada ao revendedor que é induzido a se comprometer a comprar quantidades de produto que não serão vendidas, e a pagar preços mais altos dos que os realmente praticados no mercado, o que força o posto de gasolina a se endividar, tornando o negócio inviável.
O principal abuso é a cláusula de preço de aquisição dos produtos que inclusive não é igual para todos os bandeirados da marca, ou seja, a distribuidora vende para o Posto A gasolina bem mais cara do que vende para o outro bandeirado Posto B, é comum identificar a diferença de até 0,30 centavos a mais por litro de gasolina. Quando tratamos da venda de centenas de milhares de litros por mês, o ônus financeiro é enorme.
Vamos lembrar que ser “bandeirado” é antes de tudo representar uma marca que dá “garantias” de qualidade e confiabilidade, é a promessa de ter apoio e melhores condições, o que na prática não acontece.
Outra cláusula abusiva imposta ao posto de revenda de combustíveis pela marca distribuidora é a condição de exclusividade, impedindo a aquisição de produtos de outras marcas, e, principalmente expondo seu negócio a uma concorrência desleal, ao passo que tem que vender o mesmo produto muito mais caro que seu concorrente, as vezes da mesma bandeira.
Os contratos de bandeira geram obstáculos para a livre concorrência de mercado, tornando o posto de revenda bandeirado inapto para o mercado, pois está sujeito à preços sem negociação entre as partes, o que anula a essência do contrato, que é a bilateralidade. Por isso podemos concluir o contrato de bandeira plenamente anulável, pois é um contrato de adesão, já que não permite as partes negociarem seus termos.
Considerando a exclusividade, a imposição de preços acima do mercado e o estímulo à concorrência desleal além de nulos e anuláveis os contratos de bandeira são impossíveis de cumprir.
Nenhum contrato deveria obrigar seu revendedor a trabalhar sem margem financeira, sendo obrigado a dilapidar seu capital, a ter que captar recursos em bancos para sobreviver e fazendo dívidas de diversos tipos para tentar salvar seu comércio.
O fato do contrato impor ao revendedor condições comerciais impraticáveis já é motivo para rescisão do contrato de bandeira por culpa da distribuidora.
Quando o empresário revendedor de combustíveis estiver vivendo algumas destas imposições abusivas ele tem como opção pedir a revisão judicial das cláusulas contratuais para ajustar valores de aquisição de combustíveis em relação à sua capacidade de revenda. Esses ajustes podem e serão assegurados pelo poder judiciário daqui por diante e podem ter efeitos retroativos revendo e readequando as condições vividas no passado, com possibilidade inclusive de anular dívidas e obrigações firmadas em contrato que foi readequado judicialmente.
Nestes casos é possível manter o contrato com a distribuidora em condições comercialmente viáveis ou rescindir (sem sofrer as penalidades contratuais abusivas) o contrato e transformar o posto em bandeira branca.
O código civil brasileiro tem como essência a liberdade de contratar, e com certeza contrato de bandeira não expressa a vontade das partes. O contrato tem uma função social, que impões limites, e gerar prejuízos impondo indiretamente o fracasso do negócio ultrapassa o limite da boa-fé contratual.
Revisar ou rescindir o contrato de bandeira por via judicial é uma iniciativa empresarial que manterá o posto de revenda de combustíveis em condições comerciais saudáveis, permitindo a manutenção de empregos e crescimento real do fundo de comércio.
Em resumo é possível revisar ou anular cláusulas que:
- Obrigam aquisição de produto
- Forçam aquisição de galonagem incompatível com a realidade econômica regional
- Que atribuem responsabilidade ambiental
- Que impõe multa contratual pela não aquisição de galonagem
Todos esses motivos de revisão ou rescisão de contrato dão por culpa da distribuidora, ou seja, é culpa da bandeira induzir o empresário a negócios ruins para ele, por isso deve ser responsabilizada com multas e reparações financeiras quando possível.
Ao pensar em assessoria jurídica especializada para postos de revenda de combustíveis, vale lembrar que além de revisar e rescindir o contrato de bandeira, é possível fazer um ação renovatória, em geral para alugueis nas mesmas condições, ingressar com ação de despejo para por exemplo tirar aquela loja que não paga o aluguel corretamente, propor ações para declarar inexistência de débitos (ANP/IBAMA), fazer defesas contra problemas ligados à ANP, PROCON, INMETRO, DER, ANTT, IBAMA, e outros, propor ações para reduzir o endividamento bancário reduzindo muito o valor que os bancos afirma que a empresa deve, e elaborar contrato de todos os tipos para amparar o posto de melhores garantias e condições, inclusive na aquisição de fundo de comércios.
Os revendedores de combustíveis insatisfeitos com suas distribuidoras podem se libertar da dependência contratual imposta por cláusulas abusivas, com ajuda do código de defesa do consumidor e do código civil.
Não podemos deixar que bonificações virem empréstimos e escravizem os empresários do setor de combustíveis.
Por Gilberto de Jesus da Rocha Bento Júnior, advogado e contabilista expert em advocacia empresarial, pós-graduado em direito empresarial, direito processual, direito tributário, empreendedorismo e tribunal do júri, cursou doutorado em direito constitucional. Acredita que para obter sucesso o conhecimento e cultura são fundamentais, por isso, fez mais de 300 cursos livres de assuntos diversos como marketing, negociação, matemática financeira, gestão ambiental, tributos diretos e indiretos, substituição tributária, departamento pessoal, gestão de pessoas e continua agregando conhecimento sobre a natureza humana, experiência internacional com estudos em Londres, Buenos Aires e Cape Town, e vivencias em todos os continentes.