Transportadoras podem creditar ICMS dos insumos adquiridos
A utilização de créditos de ICMS decorrentes da aquisição de insumos é muito relevante para empresas de transporte de todos os tipos, em especial aquelas enquadradas no lucro real ou no lucro presumido. O transporte é uma atividade profissional regulada pelas normas da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).
A Fazenda do Estado de São Paulo restringe a utilização de direito ao crédito de insumos por equívoco de classificação, permite crédito apenas aos insumos que integram fisicamente o produto final (para as indústrias) ou que se consomem imediata e integralmente no processo produtivo ou na prestação de serviços.
Com isso, as empresas prestadoras de serviços de transporte sediadas neste Estado têm seu direito creditório limitado basicamente aos combustíveis e ao imobilizado utilizados na prestação de serviços de transporte, diferentemente das transportadoras situadas em Estados vizinhos.
Os insumos essenciais às suas atividades consistem basicamente em mercadorias necessárias ao adequado e seguro funcionamento dos veículos e implementos, especialmente combustíveis, pneus, câmaras de ar e demais materiais rodantes; óleos, graxas, aditivos e fluídos; filtros e elementos filtrantes; tambores de freio, pastilhas de freio, lonas de freio, discos de freio e demais materiais de frenagem; baterias; tubos, mangueiras e conexões; travas, buchas, porcas e arruelas; molas, suspensões, amortecedores e demais materiais aplicados nos sistemas de suspensão e amortecimento; discos de embreagem, platôs de embreagem, servos de embreagem e demais materiais aplicados nos sistemas de embreagem; bombas de combustível, válvulas, bicos e demais materiais para o fluxo de combustíveis e fluídos; rolamentos, sensores, anéis e juntas; eixos, engrenagens, correias, correntes e demais materiais para motores; radiadores e reservatórios dentre outros que se desgastam paulatinamente durante a rodagem e necessitam de substituição sob pena de inviabilizar o serviço de transporte.
Mas como toda empresa regular, esse tipo de empresa está sujeita à incidência do imposto de competência do Estado – o ICMS (Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação), são, portanto, grandes contribuintes, e, recolhem mensalmente ICMS sob o regime de apuração periódica.
O imposto cobrado nas entradas (aquisição de mercadorias) e no recebimento de serviços de transportes é registrado como crédito em conta gráfica (adiante denominado apenas como crédito), em seus livros fiscais, para, mensalmente, ser compensado com o montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes que as empresas declaram (denominado de débito pelas saídas).
É evidente que todos estão convictos da condição de insumo dos pneus, câmaras de ar e demais materiais rodantes; óleos, graxas, aditivos e fluídos; filtros, e tantos outros, visto que as transportadoras sediadas no Paraná e em Minas Gerais, por exemplo, podem aproveitar o crédito de ICMS nas aquisições de pneus, lubrificantes e outros insumos, já que as normas expedidas pela administração fazendária local, adaptadas à LC nº 87/1996, admitem expressamente o crédito.
Todos os insumos das transportadoras são essenciais à atividade, vamos descrever de exemplificativamente sua função, demonstrando o motivo de serem essenciais.
PNEUS, CÂMARAS DE AR E DEMAIS MATERIAIS DE RODAGEM: Na prestação de serviços de transporte, os pneus, câmaras de ar e demais materiais de rodagem revestem a condição de indispensáveis, sendo um dos principais custos da empresa. Sua essencialidade evidencia-se no fato de que não há como realizar o serviço de transporte rodoviário de cargas sem a utilização de pneus, câmaras de ar e demais materiais de rodagem. O consumo ocorre diretamente no exercício da atividade-fim das Transportadoras.
Os insumos das transportadoras já vem sendo objeto de discussão judicial, considerando a importância econômica que representa na atividade, e, após várias idas e vindas em tribunais, o Poder Judiciário já consolidou entendimento permitindo o creditamento, mas essas decisões somente têm vinculação com as empresas que reivindicaram esse direito.
O Superior Tribunal de Justiça, intérprete máximo da legislação federal, já decidiu que:
“Tratando-se de uma exceção de ordem temporal que condiciona o exercício do direito de creditamento assegurado pelo caput do art. 20 da LC 87/96, a regra prevista no art. 33, I, dessa mesma lei complementar deve ser interpretada restritivamente, sob pena de, mediante eventual e indevido entendimento mais ampliativo, tornar sem efeito as importantes modificações normativas realizadas pela Lei Kandir. Assim, conforme a literalidade desse dispositivo legal, apenas as entradas referentes ao uso e consumo do estabelecimento, ou seja, do local que dá suporte à atividade fim da empresa (art. 11, § 3º, da LC 87/96), têm o direito do respectivo creditamento protraído, não sendo possível estender essa restrição às aquisições de mercadorias ou produtos a serem consumidos no processo produtivo”
Desta forma, uma mercadoria utilizada diretamente na prestação de serviços de transporte jamais poderá ser considerada como de uso ou consumo do estabelecimento e deve, portanto, possibilitar o creditamento do ICMS. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Recurso Especial nº 1.366.437/PR. Primeira Turma. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. DJe 10 out. 2013.
Era uma discussão conceitual onde o Fiscal distorcia entendimentos com finalidade de aumentar arrecadação, e ainda o faz, precisa ser contido por meio de ação judicial.
O fisco alegava que bens de consumo não tem direito à crédito, confundindo insumos como tal, mas é possível diferencia os bens de consumo dos bens de insumo da seguinte forma: Consumo e Insumo. Se deve considerar destinado ao consumo, em se tratando de certos materiais que, embora utilizados no processo de industrialização, não integram o produto industrializado. … O equívoco é evidente. Resulta do desconhecimento da distinção entre consumo e insumo.
Se os materiais são utilizados no processo de industrialização, não há consumo, mas insumo.
Os insumos são aqueles necessários ao desenvolvimento da atividade fim, esses materiais integram o seu custo, e consequentemente o seu preço de venda, ensejando a incidência do ICMS na saída do produto.
Existem decisões do STJ e do TJSP sobre esse direito creditório de ICMS – basicamente prestigiam o critério da essencialidade.: Em junho de 2013, os ministros que compõem a 1ª Seção do STJ, ao julgar o Recurso Especial nº 1.201.635/MG, submetido ao rito dos recursos repetitivos, firmaram a tese de que o ICMS incidente sobre a energia elétrica consumida pelas empresas de telefonia, que promovem processo industrial por equiparação, pode ser creditado para abatimento do imposto devido quando da prestação de serviços, amparados no critério da essencialidade. O acórdão definiu:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (CPC, ART. 543-C). ICMS. ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA PELAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. CREDITAMENTO. POSSIBILIDADE. ART. 33, II, “B”, DA LC 87/96. EQUIPARAÇÃO À INDÚSTRIA BÁSICA PARA TODOS OS EFEITOS LEGAIS. ART. 1º DO DECRETO 640/62. VALIDADE E COMPATIBILIDADE COM O ORDENAMENTO ATUAL. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. OBSERVÂNCIA. PRECEDENTE DA PRIMEIRA SEÇÃO: RESP 842.270/RS. 1. A disposição prevista no art. 1º do Decreto 640/62, equiparando os serviços de telecomunicações à indústria básica, para todos os efeitos legais, é válida e compatível com a legislação superveniente e atual, continuando em vigor, já que não houve revogação formal do aludido decreto. 2. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 842.270/RS, firmou compreensão no sentido de que o ICMS incidente sobre a energia elétrica consumida pelas empresas de telefonia, que promovem processo industrial por equiparação, pode ser creditado para abatimento do imposto devido quando da prestação de serviços. Inteligência dos arts. 33, II, b, da Lei Complementar 87/96, e 1º do Decreto 640/62.
Ademais, em virtude da essencialidade da energia elétrica, enquanto insumo, para o exercício da atividade de telecomunicações, induvidoso se revela o direito ao creditamento de ICMS, em atendimento ao princípio da não-cumulatividade. 4. O princípio da não-cumulatividade comporta três núcleos distintos de incidência: (I) circulação de mercadorias; (II) prestação de serviços de transporte; e (III) serviços de comunicação. 5. “O art. 33, II, da LC 87/96 precisa ser interpretado conforme a Constituição, de modo a permitir que a não cumulatividade alcance os três núcleos de incidência do ICMS previstos no Texto Constitucional, sem restringi-la à circulação de mercadorias, sem dúvida a vertente central, mas não única hipótese de incidência do imposto” (REsp 842.270/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/05/2012, DJe 26/06/2012). 6. Recurso especial a que se dá provimento. Acórdão submetido ao rito do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.7 (Grifou-se)
Com base nesse entendimento, ambas as turmas que compões a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça já concederam o direito ao creditamento de ICMS sobre aquisições de combustível e lubrificantes por empresas prestadoras de serviço de transporte, por reconhecer que tais produtos são essenciais para o exercício de sua atividade produtiva, devendo ser considerados como insumos. Confira-se:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. ICMS. AQUISIÇÃO DE INSUMOS QUE SE DESTINAM À ATIVIDADE FIM DA EMPRESA TRANSPORTADORA. LIMITAÇÃO TEMPORAL IMPOSTA PELO ART. 33 DA LC 87/1996. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211/STJ. AGRAVO INTERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA DESPROVIDO. … 3. A jurisprudência consolidada desta Corte Superior reconhece o direito da sociedade empresária prestadora de serviços de transporte ao creditamento do ICMS relativo à aquisição de combustível, lubrificante e peças de reposição utilizados para prestação de seus serviços, uma vez que esses se caracterizam como insumos. Precedentes: REsp. 1.435.626/PA, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJe 13.6.2014; RMS 32.110/PA, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 20.10.2010. … 5. Agravo Interno do Estado de Santa Catarina desprovido. TRIBUTÁRIO. ICMS. CONTRIBUINTE PRESTADORA DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE. PEÇAS DE VEÍCULOS UTILIZADOS NA ATIVIDADE. INSUMOS. CREDITAMENTO. ART. 20 DA LC 87/1996. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Recurso Especial nº 1.201.635/MG. Primeira Seção. Relator: Ministro Sérgio Kukina. DJe 21 out. 2013. Disponível em: . 8 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.208.413/SC. Primeira Turma. Relator: Napoleão Nunes Maia Filho. DJe 17 maio 2017.
Diante os entendimentos, não há como negar que, a aplicação do insumo na atividade-fim do estabelecimento ditará se o direito ao crédito de ICMS deve ser permitido.
Diante do óbice do Estado, o aproveitamento dos créditos de ICMS em apreço só se efetivará com a coerção judicial, meses ou anos após a aquisição dos insumos. Desta forma a correção monetária dos créditos não escriturados ou indevidamente estornados será imperativa, já que não se tratará, na espécie, de mera escrituração de crédito fiscal extemporâneo. O Supremo Tribunal Federal já proferiu decisão em que, havendo óbice da Fazenda para a utilização dos créditos pelos Contribuintes, é imprescindível a correção monetária mesmo que não haja previsão legal para sua incidência:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREQUESTIONAMENTO. EXPORTAÇÃO. PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS. ICMS. MATÉRIA-PRIMA E OUTROS INSUMOS. COMPENSAÇÃO. AUTORIZAÇÃO LEGAL. SUSPENSÃO LIMINAR. CRÉDITO IMPOSSIBILITADO. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA POSTERIORMENTE. RETORNO DA SITUAÇÃO AO STATUS QUO ANTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. CABIMENTO. 1. Prequestionamento. Ausente o interesse de recorrer, por falta de sucumbência, basta para o atendimento do requisito que a tese jurídica suscitada como causa de pedir tenha sido objeto das contrarrazões apresentadas pela parte por ocasião dos recursos de apelação e extraordinário, e também tratada nos embargos de declaração. 2. ICMS. Compensação autorizada pelo artigo 3º da Lei Complementar federal 65/91. Regra legal suspensa liminarmente. Julgamento de mérito superveniente que reconheceu a constitucionalidade do dispositivo (ADI 600, DJ 30/06/95). Efeitos ex-tunc da decisão. Créditos escriturais não realizados no momento adequado por óbice do Fisco, em observância à suspensão cautelar da norma autorizadora. Retorno da situação ao status quo anterior. Garantia de eficácia da lei desde sua edição. Correção monetária devida, sob pena de enriquecimento sem causa da Fazenda Pública. 4. Atualização monetária que não advém da permissão legal de compensação, mas do impedimento causado pelo Estado para o lançamento na época própria. Hipótese diversa da mera pretensão de corrigir-se, sem previsão legal, créditos escriturais do ICMS. Acórdão mantido por fundamentos diversos. Recurso extraordinário não conhecido.13 (Grifou-se) O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 1.035.847/RS, na forma do artigo 543-C, do CPC, deixou assentado entendimento no sentido de que quando é a própria Fazenda que impede o contribuinte de efetuar a utilização dos créditos a que tem direito, eles perdem a natureza de “escriturais”, passando a ser devida a correção monetária14: Essa orientação culminou na edição da Súmula nº 41115, aprovada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “é devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco”. O raciocínio ali exposto, destinado à correção dos créditos de IPI, é perfeitamente aplicável aos créditos de ICMS tratados na presente medida, eis que há ilegítima oposição ao aproveitamento destes por parte do fisco. A taxa de juros de mora aplicada pelo Fisco Estadual quando da cobrança de seus débitos é equivalente, por mês, à taxa SELIC, acumulada mensalmente, e a 1% para fração de mês, assim entendido qualquer período inferior a um mês, nos termos fixados no artigo 96 da Lei Estadual nº 6.374/1989 (com redação dada pela Lei Estadual nº 16.497/2017). Desta forma, é imperioso o acréscimo de juros ao crédito de ICMS a que faz jus as Autoras, até o mês de sua efetiva compensação ou transferência, pelos mesmos índices utilizados pelo fisco na cobrança administrativa de seus créditos tributários em atraso, sob pena de que a demora para a solução do presente caso acarrete o enriquecimento ilícito do Estado. 09. DO PEDIDO: Pelo exposto, com suporte na Lei nº 12.016/2009 e no inciso LXIX do artigo 5º 13 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão no Recurso Extraordinário nº 282.120-9/PR. Segunda Turma. Relator: Ministro Maurício Corrêa. DJ. 06 dez. 2002, p. 75. Disponível em: . 14 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Recurso Especial nº 1.035.847/RS. Primeira Seção. Relator: Ministro Luiz Fux. DJ de 3 ago. 2009. Disponível em: . 15 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 411. DJ 16 dez. 2009.
Em última análise toda transportadora deveria poder escriturar, manter e de aproveitar os créditos de ICMS relativos aos insumos empregados na atividade-fim dos estabelecimentos (prestação de serviços de transporte), que sofram alterações, tais como o desgaste, o dano ou a perda de propriedades físicas ou químicas, em função da sua aplicação na prestação de serviços de transporte.
E como consequência, deveriam ter o direito de deixar de recolher o diferencial de alíquota do ICMS sobre os insumos erroneamente enquadrados como material de uso ou consumo do estabelecimento, quando estes forem adquiridos de contribuintes localizados em outra Unidade da Federação, como são lançamentos equivocados, deveriam se restituir de todos esses lançamentos que deixaram de ser aproveitados nos 5 anos, para utilizar a legislação estadual pertinente permitirem (compensação com débitos próprios, de outros estabelecimentos ou transferência a terceiros, no caso de exportação).
Por Gilberto Bento Jr.